Aqueles que nos inspiram

Coluna Física sem Mistério
Ciência Hoje On-line
Publicada em 20/02/2015

Em sua coluna de fevereiro, Adilson de Oliveira reverencia professores, museus de ciência e outras iniciativas de popularização científica e fala da importância do ensino e da divulgação da ciência para despertar em crianças e jovens o interesse em seguir a carreira de cientista.

o mês de fevereiro, além de normalmente ter carnaval, muitas pessoas retornam de suas férias, em particular os estudantes, tanto do ensino fundamental e médio quanto do superior. Inicia-se um novo ano escolar e volta a rotina de aulas, estudos e provas. Em seus diferentes níveis, os alunos têm simpatia por determinada disciplina ou determinado professor. O melhor é quando as duas coisas acontecem simultaneamente.
Costumamos lembrar de algum professor que gostávamos por causa da maneira como ele explicava os conteúdos e que nos estimulava a estudar mais. Outros, ao contrário, fizeram com que não gostássemos de determinada disciplina. Por um lado, esses mestres acabam se tornando inspiração para os alunos seguirem determinadas carreiras; por outro, podem afastá-los de determinados caminhos.
A maioria das pessoas que escolheram seguir a carreira científica teve alguém que fez despertar nelas a vontade de ser cientista. Provavelmente foi um momento mágico onde, por meio de um experimento ou de uma explicação, a curiosidade e o fascínio pela ciência bateram fundo na alma, fazendo surgir aquele famoso ‘brilho nos olhos’. Um mestre inspirador é sempre fundamental para podermos construir os nossos sonhos.
s professores de ciências são essenciais para inspirar jovens a seguir as carreiras científicas. Em meu caso particular, tive uma professora que fez toda a diferença, embora também tivesse outros que me falavam para não tentar ser físico, pois isso não me traria um bom futuro.

A importância do professor para despertar o interesse dos alunos pela Ciência

 Mas, além dos professores, existem outros atores e situações que podem estimular o desejo de ser cientista. Pode ser um livro, uma palestra de cientista, uma série de TV, uma visita a um museu ou centro de divulgação de ciências.
Os museus de ciência são muito importantes para despertar o interesse pela ciência. Ao visitar esses espaços, é possível entrar em contato com experimentos e demonstrações que podem não apenas nos deixar curiosos, mas também fascinados pela ciência. Experimentos simples ou complexos podem estimular a curiosidade, mas o mais importante é a pessoa que pode nos ajudar a entender o que acontece, seja ela o professor que acompanha os alunos ou o monitor que está mostrando a experiência.
Nesse momento, é de fundamental importância mostrar que, mais que uma simples curiosidade, ali está acontecendo um fenômeno físico, químico ou biológico que não somente podemos produzir, mas também entender como ele acontece. É importante desmistificar para compreender a natureza.
Mas apenas apresentar os fenômenos físicos, mesmo mostrando por que eles ocorrem, não é suficiente para despertar a curiosidade. De certa forma, admiramos e nos inspiramos naquilo que é belo e fascinante. Nesse aspecto, na minha opinião, existem duas ciências que, quando apresentadas de forma inspiradora, fascinam qualquer pessoa, tanto crianças quanto adultos:  astronomia e biologia.

A fascinante astronomia

Olhar para o céu e admirar a sua beleza está ao alcance de qualquer um de nós (desde que estejamos em um lugar de céu limpo e pouco iluminado). Um céu estrelado sempre foi inspirador não somente para os cientistas, mas também para os poetas e artistas. Com um pequeno telescópio, é possível ir além e ver coisas maravilhosas que estão fora do alcance do olho nu, como as crateras na Lua, as luas de Júpiter e os anéis de Saturno.
Com o advento da internet, tornou-se extremamente fácil conseguir imagens feitas pelos grandes telescópios de planetas, nebulosas, galáxias, quasares, entre outros. Com um clique, podemos encontrar milhares de belas imagens.
Uma imagem como a da galáxia de Andrômeda é bela e intrigante. Ela fica mais fascinante quando descobrimos que uma galáxia é composta por bilhões de estrelas unidas gravitacionalmente.
A galáxia de Andrômeda está a cerca de 2 milhões de anos-luz de distância de nós. Um ano-luz corresponde à distância que um raio de luz, que viaja a 1,08 bilhões de km/h, percorre ao longo de um ano e equivale a aproximadamente 10 trilhões de quilômetros. A luz que gerou a imagem nos mostra como era essa galáxia há 2 milhões de anos, época em que os seres humanos ainda não habitavam o nosso planeta. Perceber que olharmos para o céu é olhar para o passado é algo muito interessante.

Galáxia de Andrômeda - O objeto mais distante que se pode observar a olho nu
Olhar para o céu e perceber a imensidão do cosmos nos remete a questões muito fundamentais, como a origem de todo o universo, o seu destino e sua evolução. E o mais importante é saber que, mesmo habitando um pequeno planeta ao redor de uma estrela comum de uma dentre as bilhões de galáxias existentes, somos capazes de propor explicações para tudo isso.
Da mesma maneira, descobrir os mistérios da vida, como ela surgiu em nosso planeta, é fascinante. Entender como Charles Darwin ao longo da sua famosa viagem a bordo do Beagle percebeu que as espécies evoluíram é compreender uma das maiores descobertas da ciência em todos os tempos. Assim como acontece na astronomia, as imagens geradas por microscópios também são capazes de nos mostrar formas tão belas quanto galáxias e nebulosas e com uma complexidade muito maior. Como átomos e moléculas se combinam para formar estruturas tão complexas como nós, seres pensantes sobre a nossa própria origem e destino?

Minha inspiração

Quando eu era adolescente, nas manhãs de sábado e domingo, no começo dos anos 1980, encontrei o meu maior inspirador para ser cientista: Carl Sagan, apresentador da série Cosmos. A linguagem simples e acessível do programa e sua maneira então inédita de apresentar física, química, astronomia, biologia, história, entre outras disciplinas, fizeram com que eu me apaixonasse pela ciência e me levaram a procurar o caminho para ser cientista. Naquela época, também tive contato com exemplares da Ciência Hoje e outras revistas de divulgação científica, que foram fundamentais para que eu me interessasse pela carreira científica.

Carl Sagan (1934-1996)

Há cerca de um ano, foi lançado um remake da série original – Cosmos: uma jornada pelo espaço-tempo –, agora estrelado pelo astrofísico norte-americano Neil deGrasse Tyson, que tem a grande missão de não somente atualizar os conteúdos de 30 anos, mas também tentar ser relevante para uma nova geração que é totalmente conectada às informações a todo momento. O resultado, na minha opinião, foi muito bom, mas sou suspeito para falar.
Inspirar novas gerações a se interessar pela ciência é um enorme desafio. Não é uma missão apenas para os professores de ciências, que são os grandes batalhadores dessa empreitada, mas também para todos que fazem da ciência sua profissão e paixão. Embora não seja perfeita e não resolva todos os problemas que vivemos, a ciência é uma das maiores criações da humanidade, um patrimônio que pertence a todos e, por isso mesmo, deve ser acessível a todos. Um desafio que a Ciência Hoje vem enfrentando há várias décadas. E eu me orgulho de fazer parte dessa caminhada.

Adilson de Oliveira
Departamento de Física
Universidade Federal de São Carlos

Comentários

Postagens mais visitadas