A Física Quântica e o Nobel
Coluna Física sem mistério
Ciência Hoje on-line
publicada em 19/10/2012
Ciência Hoje on-line
publicada em 19/10/2012
Todos os anos, no começo do mês de outubro, cria-se no meio científico muita expectativa em relação ao anúncio dos ganhadores do prêmio Nobel. Esse prêmio é considerado uma das mais importantes honrarias para os cientistas – embora também seja concedido para as áreas de literatura e paz, que não estão associadas à investigação científica.
Com relação ao prêmio de física de 2012, até brinquei com os meus alunos que eu não tinha recebido nenhum telefonema da Academia Real Sueca de Ciências – instituição responsável pela escolha – e teria que esperar o próximo ano. Eu sei que é altamente improvável que eu receba esse telefonema, mas sem dúvida todo físico um dia sonhou em ganhar tal honraria.
O primeiro laureado com o prêmio Nobel de Física, em 1901, foi o físico alemão Wilhelm Conrad Röntgen (1845-1923), pela descoberta dos raios X, uma radiação eletromagnética com comprimento de onda da ordem de um décimo de nanômetro (um nanômetro equivale a um bilionésimo de um metro) e que pode ser utilizada para o estudo das estruturas atômicas e a realização de imagens do interior do corpo humano – aplicação bem conhecida.
Neste ano, o prêmio foi dado ao pesquisador francês Serge Haroche e ao norte-americano David J. Wineland pela criação de “métodos experimentais que permitem medir e manipular sistemas quânticos individuais”. É mais um prêmio concedido ao desenvolvimento de um dos pilares da física: a física quântica.
Esse ramo da física começou a ser desenvolvido no início do século 20, quando novas descobertas começaram a mostrar que os conceitos da física clássica (a mecânica newtoniana, o eletromagnetismo e a termodinâmica) não conseguiam explicar alguns resultados experimentais observados.
Um exemplo foi a teoria proposta em 1899 pelo físico alemão Max Planck (1858-1947) para explicar o comportamento da radiação emitida por um corpo negro. Um corpo negro ideal é um corpo que absorve toda a radiação incidente sobre ele e, depois de aquecido, emite radiação com determinada característica. Se fossem utilizados o eletromagnetismo e a termodinâmica conhecidos na época para explicar esse comportamento, surgia uma discordância entre os conceitos teóricos e os resultados experimentais.
Planck então deduziu uma fórmula que descrevia os resultados experimentais. Para obtê-la, ele introduziu o conceito de que a energia em um corpo negro somente poderia ser absorvida na forma de valores discretos, em ‘pacotes’ – ou quanta, termo em latim que acabou batizando o ramo da física que nascia ali.
O físico propôs que a energia era resultado da multiplicação da frequência da radiação por uma determinada constante, que posteriormente foi batizada com seu nome (constante de Planck) e é igual a 6,62 x 10-34 J.s (onde J = joule, unidade de energia; s = segundo). Esse é considerado o marco do início da física quântica. Por essa descoberta e outras contribuições, Planck recebeu o Nobel de Física em 1918.
Novos conceitos
No século 20, ocorreram os principais desenvolvimentos no campo teórico da física quântica. A grande maioria dos prêmios Nobel de Física naquele século foi dada a avanços tanto na teoria como em experimentos e aplicações desse ramo da física.
Um dos conceitos introduzidos pela física quântica que tiveram impacto profundo na nossa compreensão da natureza foi o princípio da incerteza (ou princípio da indeterminação), proposto pelo físico alemão Werner Heisenberg (1901-1976) em 1927. Esse princípio introduziu a ideia de que é impossível conhecer com absoluta certeza simultaneamente a posição e a quantidade de movimento de uma partícula.
Esse princípio também limita nossa percepção em relação ao tempo e à energia de uma partícula. Essa limitação não é tecnológica, mas sim uma imposição da natureza e faz parte da essência do mundo em escala atômica.
Heisenberg não apenas desenvolveu esse princípio, mas também uma nova teoria para explicar o comportamento dos entes atômicos que ficou conhecida como mecânica quântica matricial. Nessa teoria, as propriedades das partículas são descritas por matrizes e podem ser calculadas pela realização de operações entre essas matrizes. Por essas contribuições, ele foi laureado com o Nobel de Física em 1932.
No ano seguinte, a Fundação Nobel concedeu o prêmio para o físico austríaco Erwin Schrödinger (1887-1961) e o físico britânico Paul Dirac (1902-1984) por desenvolvimentos de novas versões da teoria quântica. Schrödinger formulou uma teoria ondulatória para explicar o comportamento dos entes quânticos e Dirac mostrou que tanto a teoria de Schödinger quanto a de Heisenberg eram equivalentes, ou seja, levavam aos mesmos resultados. Dirac também ampliou essas teorias, ao incorporar os conceitos da teoria da relatividade restrita de Einstein, e criou uma versão relativística da física quântica.
Física quântica aplicada
Descobridores de aplicações dos princípios da física quântica também receberam vários prêmios Nobel de Física. Um deles foi concedido em 1964 aos físicos russos Nicolay Basov (1922-2001) e Alexander Prokhorov (1916-2002), por seus trabalhos fundamentais que permitiram o desenvolvimento do laser (fonte de luz com comprimento de onda bem definido). As aplicações do laser são inúmeras, desde a utilização na leitura de CDs e DVDs até a realização de cirurgias e o tratamento de doenças.
No caso do prêmio Nobel de Física deste ano, os ganhadores, trabalhando de maneira independente, desenvolveram técnicas que permitiram isolar partículas e observar seu comportamento individual.
David J. Wineland desenvolveu uma armadilha para prender íons (átomos eletricamente carregados) em campos elétricos e conseguiu deixar essas partículas no seu nível mais baixo de energia, o que permitiu a observação de seus efeitos quânticos. Já o francês Serge Haroche aprisionou fótons dentro de uma pequena cavidade entre dois espelhos e conseguiu obter a reflexão de apenas um único fóton antes que ele fosse absorvido pelos próprios espelhos.
Ganhar o prêmio Nobel de Física é apenas para poucos pesquisadores e é um reconhecimento da importância da descoberta por eles realizada. Claro que muitas vezes se discute a relevância do feito e se o trabalho de outro pesquisador que também contribuiu para a descoberta foi desconsiderado. Mas o fato é que o cientista que ganha o prêmio Nobel deixa seu nome marcado na história.
Adilson de Oliveira
Departamento de Física
Universidade Federal de São Carlos
Adilson de Oliveira
Departamento de Física
Universidade Federal de São Carlos
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