O maravilhoso fenômeno da vida
Publicado em 24 de junho de 2009
Nas manhãs de sábado, em meados da década de 70, quando ainda eu era um garoto, tinha o hábito de sentar na frente da televisão (que era preto e branco e com a imagem cheia de chuviscos) para assistir o meu programa favorito. Quando ouvia a frase: “O espaço... a fronteira final. Estas são as viagens da nave estelar Enterprise ...”, a minha imaginação viajava junto com o capitão Kirk e o senhor Spock, que navegavam pelas estrelas e descobriam novas civilizações no distante século XXIII. O programa era “Jornada nas Estrelas” (Star Trek), que recentemente ressuscitou com um novo filme, mas mantendo o espírito original
A série foi apresentada pela primeira vez na televisão americana em setembro de 1966, em plena época da corrida espacial entre os americanos e os soviéticos. Os roteiristas da série retratavam uma época 300 anos no futuro, onde a humanidade viajava facilmente pelas estrelas, entrando em contato com outras espécies e civilizações. Por enorme coincidência a grande maioria dos alienígenas encontrados pela tripulação da Enterprise tinha a forma e a aparência muito semelhante a dos seres humanos.
A formação dos tijolos básicos da vida
Refletindo um pouco sobre isso, no dias de hoje, me parece que tal semelhança seria uma extraordinária coincidência. Seria conveniente encontrarmos alienígenas muito parecidos com nós. No caso específico da série existiam dificuldades técnicas e financeiras para produzir seres diferentes de nós. Entretanto, do ponto de vista científico, talvez seja muito pouco provável que a vida evolua em outros planetas de maneira tão semelhante a nossa.
As formas de vida mais antigas apareceram por volta de 3,8 bilhões de anos, ou seja, aproximadamente 1 bilhão de anos após a formação da Terra. Devido a circunstâncias particulares da formação do nosso planeta e do sistema solar, como por exemplo, a emissão de radiação do Sol, a distância Terra-Sol, a gravidade terrestre, os elementos que compunham a atmosfera primitiva do nosso planeta etc, permitiram que a vida surgisse. O fato da atmosfera da Terra primitiva ser muito diferente da atual foi um fator importante para que hoje estejamos aqui.
Devido à baixa intensidade do campo gravitacional terrestre (quando comparado com os planetas gigantes dos sistema solar) os elementos leves como o hidrogênio e o hélio escaparam para o espaço, ao contrário do que ocorreu com Júpiter e Saturno que os mantêm até hoje. Dessa forma, a atmosfera primitiva da Terra foi formada por gases liberados do seu interior quente por meio de intensa atividade vulcânica que durou por cerca de 100 milhões de anos. Esse processo fez com que surgisse uma atmosfera rica em moléculas como H2O (água), CO2 (gás carbônico), H2S (gás sulfrídico), CH4 (metano) e NH3 (amônia). Nessa época não existia oxigênio molecular (O2). Caso existisse, ele impediria a formação de grandes moléculas orgânicas. Essas substâncias e a energia fornecida pelos raios ultravioletas do Sol (nessa época não havia a camada de ozônio para bloqueá-los) e as violentas descargas elétricas (relâmpagos) foram responsáveis pela formação das primeiras moléculas orgânicas complexas.
Em 1953, os cientistas americanos Stanley L. Miller (1930-2007) e Harold C. Urey (1893-1981) da Universidade de Chicago realizaram experimentos para simular as condições da atmosfera primitiva da Terra. Eles mostraram que é possível transformar 2% do carbono disponível nos elementos que existiam nela em aminoácidos, que são as bases das proteínas. Alguns anos depois, em 1961, Joan Oró (1923-2004), na Universidade de Houston no Texas, conseguiu produzir adenina, uma das quatro bases das moléculas de RNA (ácido ribóssico nucléico) e DNA (ácido desoxirribonucléico) a partir de HCN (cianeto de hidrogênio) e amônia em uma solução aquosa, elementos abundantes na Terra primitiva. Esses experimentos não garantem que aconteceu exatamente isso em nosso planeta há bilhões de anos, mas mostram que, em princípio, essas condições permitem a produção dos elementos básicos para a formação de moléculas complexas, necessárias para o surgimento da vida.
Dessa situação inicial até o surgimento de vida inteligente, como a nossa, foram necessários bilhões de anos de evolução. O passo fundamental para isso foi o aparecimento do DNA, pois esta molécula “sabe” fazer cópias de si mesma. Todas as formas de vida que existem hoje na Terra, desde a mais simples bactéria até os seres humanos, são baseadas na molécula de DNA. Cada espécie tem um código genético específico, mas todos os genes que os compõem são formados pelas mesmas bases químicas. Essa é uma evidência que toda a vida na Terra teve um ancestral comum, algo como uma bactéria primitiva que evoluiu de diferentes formas para encher o nosso mundo de vida.
A busca da nossa origem em outros mundos
A recente missão da sonda Cassini-Huygens até o planeta Saturno tem como um dos seus objetivos principais estudar a lua Titã, a única do sistema solar que apresenta uma densa atmosfera. Os cientistas esperam encontrar nela um ambiente semelhante ao da Terra primitiva, pois a sua atmosfera é rica em hidrocarbonetos e provavelmente lá existam descargas elétricas intensas. Será como olhar para o passado da Terra, mas congelado devido às baixas temperaturas existentes naquele satélite. Em janeiro de 2005, o explorador Huygens penetrou na atmosfera desse mundo gelado e pode enviar as primeiras imagens desse satélite. As informações que ela obteve dará trabalho por vários anos a muitos cientistas. Talvez elas nos revelem alguns dos segredos da origem da vida em nosso planeta.
Se algum dia encontrarmos outras formas de vida desenvolvidas fora do nosso planeta, por mais simples e primitiva que seja, poderemos ter uma nova perspectiva para compreender as nossas origens. Uma única bactéria alienígena poderá mudar o nosso paradigma a respeito da vida e muitos mistérios serão resolvidos, mas com certeza outros mais complicados aparecerão. Talvez seja difícil encontrarmos civilizações extraterrestres, como aquelas visitadas pelos tripulantes da Enterprise no século XXIII, dadas as incomensuráveis distâncias que estamos das estrelas. Contudo, como dizia o astrônomo e divulgador da Ciência, Carl Sagan (1934-1996) em seu livro “Contato”: “Não deveremos estar sós neste universo, senão seria um enorme desperdício de espaço”
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